Carregando...

Trânsito: uma ação de inclusão social?.

Instantaneamente ao se pensar sobre trânsito projetamos imagens de movimentos, deslocamentos, estacionamentos, paradas, ação de carregar ou descarregar mercadorias, veículos, pessoas, congestionamentos, velocidades, acidentes, símbolos, enfim, diversas imagens que se interagem no tempo e no espaço configurando não somente uma paisagem física do objeto concreto, mas também, uma paisagem social, em que esta só poderá ser visualizada pela mensuração das ações humanas embutidas no nível de sua cultura, economia, educação e política que uma determinada sociedade possui.
A visão de socialização somente será construída através do interesse da própria sociedade, dos meios utilizados no espaço publico viário e da gestão publica possuidora de poder legal para organizar sua sociedade e seu território.

Algumas formas de organização espacial podem ser vistas a partir das ações do Estado e comportamento da sociedade que habita um local. A forma como estes externam seu modo de vida; as intervenções publicas e do capital no meio; o tipo de transporte coletivo que se oferece e, as conexões intra urbana na cidade, particularizam as relações desenvolvidas por todos, porém, diferente em sua forma, por exemplo, aqueles que estão a pé ou em um veículo.
A estrutura física do ambiente e as práticas sociais revelam quem pode, como pode e onde pode ser usado o espaço público. Surgem assim as seguintes conjecturas: existe um espaço apropriado para o idoso e portadores de necessidades especiais? As políticas publicas são pensadas para estes? A sociedade respeita seus espaços, suas condições, seus direitos? A sociedade local pensa na inclusão social como parte da prática de sua cidadania? Todavia, estes contra-sensos exigem a contextualização da formação conceitual do que é trânsito e inclusão social.
As mudanças no sistema social no decorrer da história levaram as diversas transformações, entre elas, o império do capital e a tecnologia como técnica para produção. A Revolução Industrial (1760-1830), foi a mola propulsora para a era das máquinas, trouxe a evolução dos motores e, conseqüentemente, a fabricação do automóvel, modernização e crescimento das cidades em uma explosão demográfica. Intensificando os fluxos principalmente nas cidades e fazendo deste século o trânsito como um dos maiores problemas urbanos. “[...] A medida que as cidades crescem: a “questão” do trânsito faz parte da “questão” urbana de nossa época. (VASCONCELLOS, 2011)
Com o mesmo entendimento, ARAÚJO (2010, p.60) afirma que, “O conceito de trânsito está relacionado, portanto, à própria vida em sociedade e passou a ser sedimentado na medida em que os deslocamentos humanos passaram a ser cada vez mais freqüentes, na formação das cidades.
Com um conceito restritamente técnico o Código de Trânsito Brasileiro-CTB, estatuiu a ação do trânsito como: A utilização das vias, por pessoas, animais e veículos, isolados ou em grupo, conduzidos ou não, com a finalidade da circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga. (art. 1º, § 1º, 2009).
Contudo, embora se discuta o trânsito em formas técnicas ou sociais, é inerente dizer que todas as ações apresentam uma forma de deslocamentos sobre um determinado espaço. E isso implica de como estes serão realizados por todos em um determinado tempo.

Igualdade Social e Acessibilidade para TODOS
A palavra “TODOS” induz por si só um sentido de coletividade levando os indivíduos a uma condição de igualdade, tanto em suas práticas como em seus direitos, sem distinção nas diferenças físicas, de raça, cor e classe social.
Segundo a Constituição Brasileira, no caput do artigo 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade [...] (1988, p.15, grifo nosso).
A igualdade na descrição legal da lei é mostrada como garantia jurídica, mas o problema está na prática real. Quando se contextualiza o direito a igualdade para a locomoção e fluidez nos espaços públicos, observa-se a falta de respeito com o cidadão portador de necessidades especiais, especificamente, idosos e deficientes físicos. As áreas de estacionamentos, específicos à estes, são ocupadas por outros sem necessidades especiais; as poucas guias rebaixadas (rampas) de acessibilidade são más sinalizadas e interditadas por veículos estacionados, como também, por barracas que territorializam as calçadas e a malha viária. Nos transportes públicos de passageiro coletivo existe a indicação dos assentos exclusivos para estes, porém ocupados por outros que de fato não teem direito. Raramente se vê semáforos sonoros para pedestre com deficiência visual. Programas ou campanhas educativas de trânsito especificas para portadores de deficiência visual, físico, motora e auditivos não são planejadas e executadas. Ações estas individuais ou de gestão pública que raramente se pratica como forma de inclusão social.
Os acessos aos locais e suas condições apresentam problemas de acessibilidade pelo simples fato dos mesmos não serem pensados para os transuentes e nem naqueles com mobilidade restrita, pelo contrário, a cidade e seus espaços são projetados para a máquina, o automóvel, o que é maior, visível e veloz.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE publicou que 14,5% da população brasileira são portadores de alguma deficiência. Aproximadamente, 24,6 milhões de pessoas, ou 14,5% da população total, apresentam algum tipo de deficiência ou incapacidade. São pessoas com ao menos alguma dificuldade de enxergar, ouvir, locomover-se ou alguma deficiência física ou mental. Valores que correspondem a 1.416.060 de deficientes físicos, 16.644.842 de deficientes visuais, 5.735.099 de deficientes auditivos e 7.939.784 com deficiências motoras.
Segundo o setor da entidade de seguros com acidentes de trânsito, o Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores em Vias Terrestres – DPVAT, mais de 60% das indenizações pagas no último ano foram destinadas à vítimas de acidentes envolvendo motociclistas. O mesmo seguro pagou 252.351 indenizações a vítimas de acidente de trânsito, sendo 50. 780 ressarcimento por morte, 151. 558 por INVALIDEZ PERMANENTE e reembolso de despesas. Mais de 68% das pessoas que receberam indenização por invalidez permanente estavam envolvidas em acidentes com motociclistas. De tal forma, compreende-se uma classe de condutores em um meio de transporte especifico de alto risco, onde os mesmo apresentaram algum tipo de invalidez. A Sociedade Brasileira de Neurocirurgia – SBN estima que ocorram mais de 10 mil novos casos de lesão medular no Brasil por ano.
Portanto, pode-se pensar que a sociedade brasileira está preparada para incluir estas pessoas no momento presente e futuro? Onde está a prática da inclusão social? É necessário discutir está questão? O Brasil está preparado para aquele que é diferente?

Contextualizando a inclusão social
Inicialmente para se contextualizar o que é inclusão social se faz necessário pensar em sua antítese. Inclui-se o que outrora se excluiu, e a exclusão se faz por seletividade. Pensar a sociedade capitalista sem esta seleção, que prioriza a materialidade, a territorialidade, a velocidade e a segregação espacial, é quase impossível dissociar a exclusão.
A exclusão social pode ser vista em três dimensões: primeira, a dimensão material e objetiva da desigualdade social e econômica, a segunda refere-se à ética da injustiça social e dos preconceitos; e a terceira dimensão, subjetiva, de sofrimento imposto a milhões de seres humanos. AMARO (2010) considera que, a exclusão social é essencialmente uma situação de falta de acesso as oportunidades oferecidas pela sociedade aos seus membros. Tais afirmações e percepções se fazem pensar que a exclusão também é retirar o direito de alguns citadinos de usufruir da cidade. Desta forma limitando-os dentro de suas já existentes limitações.
O Brasil é um país que apresenta uma distorção na garantia dos direitos humanos. Aqueles não vistos aos olhos da normalidade física e psíquica são considerados incapazes e inferiores para interagir em seu meio. Sempre expressando a dependência de algo ou alguém. Sem direito a inserção e inclusão social. Porém, o processo de conquista dos direitos daqueles é a passos lentos, principalmente, na prática real nos espaços públicos. A construção conceitual da inclusão se faz na contextualização social e jurídica, conforme Thais Pacievitch (2010):

Inclusão social é um termo amplo, utilizado em contextos diferentes, em referência a questões sociais variadas. De modo geral, o termo é utilizado ao fazer referência à inserção de pessoas com algum tipo de deficiência às escolas de ensino regular e ao mercado de trabalho, ou ainda a pessoas consideradas excluídas, que não tem as mesmas oportunidades dentro da sociedade, por motivos como: condições sócio – econômicas, gênero, raça, falta de acesso a tecnologias (exclusão digital).

Já Valéria Cristina Gomes Ribeiro em seu artigo: “O Direito das Pessoas Portadoras de Deficiência Física”, faz um recorte histórico e jurídico da inclusão social descrevendo:

O processo de inclusão social de pessoas com necessidades especiais tornou-se efetivo a partir da Declaração de Salamanca, em 1994, respaldada pela Convenção dos Direitos da Criança (1988) e da Declaração sobre Educação para Todos (1990).
Após muita luta, empreendida pelos movimentos sociais ligados ao portador de deficiência, surge em 1975 a "Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes" resolução elaborada pela Organização das Nações Unidas, aprovada pela sua Assembléia Geral e mundialmente enfatizada em 81 – o Ano Internacional da Pessoa Deficiente (AIPD), que teve como tema "Participação e Plena Igualdade".
O texto legal estatuiu que na sua aplicação e interpretação seriam considerados os valores básicos da igualdade de tratamento e oportunidade, da justiça social, do respeito à dignidade da pessoa humana, do bem-estar, além de outros, indicados na Constituição ou justificados pelos princípios gerais de direito.

Desta forma, Inclusão social é uma ação que combate a exclusão social geralmente ligada a pessoas de classe social, nível educacional, portadoras de deficiência física e mental, idosas ou minorias raciais entre outras que não têm acesso a certos serviços e oportunidades.
Portanto, nas colocações apresentadas se busca visualizar para além da aparência. Onde o espaço para a realização das ações de trânsito é um ambiente de troca, de oportunidades, e porque não de solidariedade, de interação e inclusão. E, para não se concluir a discussão, se propõe uma reflexão das ações sejam individualizadas, coletivas ou publicas, para que estas encontrem uma isonomia para todos e por todos.